quinta-feira, 31 de março de 2011

Ninguém precisa

(Texto de: Ailin Aleixo - Blog: A Mulher Honesta - Revista Alfa)


Ninguém precisa de interlocutor que fala cuspindo e termina a conversa com todos os seus perdigotos depositados sobre a cara alheia.
De quem tem certeza de que sua vida e predileções são o norte da civilização.

Da mistura de esnobismo e babaquice que resulta no diagnóstico: cerveja é bebida de pobre.

De sexo tântrico, pilha fraca no controle remoto, conversa de elevador, bafo matinal, ovo mexido seco.

De espertinho que anda pelo acostamento quando a estrada está cheia e ainda buzina pra abrir caminho.

Ninguém precisa de cidadão que maltrata garçom.

De gentinha preconceituosa, tão tacanha que desconhece que preconceito apenas denota ignorância e tosquice.

De quem frequentou a escola e, mesmo assim, escreve “agente fazemos”, “talves dá certo”, “derrepente”.

De seres que ouvem música, qualquer que seja, no volume máximo sem se dar conta que ouvido alheio não é pinico e que vizinhança não é palco.
De gente que vive de herança e jamais ouviu falar em trabalho.

Ninguém precisa de perua que gasta mil reais em um par de sapato mas acha demais dar dois reais para o moço que carrega suas compras no supermercado.

De pessoinhas que dizem que amar animais e defendê-los é atitude de quem não se importa com crianças abandonadas ou algo “mais importante”.

De homem que paga qualquer coisa—um drinque ou um colar de pérolas—para uma mulher e pensa que isso dá o direito de agarrá-la, afinal o “pedágio” foi quitado.

De quem palita os dentes à mesa—e fazendo barulho.

De botox.

De absorvente com estampa.

Mas para aguentar tudo isso, preciso de um drinque. Constantemente.

domingo, 6 de março de 2011

Páginas

As vezes é difícil olhar, porque a verdade é como um espelho..

Não sabia de onde vinha aquela voz aguda, se era conselho, ordem ou seja lá o for, só havia a consciência de que lhe encerrava. As tardes se abriam ásperas, e o escuro da solidão era seu único refugio. E mesmo assim, nao era um local seguro. O som, logo venceria ausência de luz.

A fuga, é algo que está presente em todos.

terça-feira, 1 de março de 2011

Risando


Minha neta já está com um vocabulário de tribuno, mas às vezes precisa improvisar. No outro dia me contou que tinha visto uma coisa engraçada na rua e disse:
_ Eu risei!
Não deixava de haver lógica no erro. Quem da risada, risa.
Você pode argumentar - se for um avô de fé - que rir e risar não é a mesma coisa. Nossa lexicógrafa precoce pode muito bem ter inaugurado um novo verbo, de grande utilidade na distinção entre dois tipos de reação. Pois não se ri e se risa das mesmas coisas.

Há o que é para rir e há o que é para risar. Rir pode ser um reflexo nervoso causado por alguém (o Kadafi) ou alguma coisa (a política brasileira), risar pode ser uma pura expressão de prazer.Você ri com ironia, ri com desdém ou ri para não chorar, mas risa com gosto, risa do que lhe diverte ou agrada. As razões para rir se multiplicam, as razões para rizar escasseiam. Mas espero que minha neta só encontre razões para risar nessa vida.

*Coluna de Luís Fernando Verissimo no Jornal Zero Hora em 28 de Fevereiro de 2011